Em
1494, através do Tratado de Tordesilhas, as duas maiores nações da Ibéria
dividiram o mundo. Embora Portugal se lançou ao mar através da facilidade de
sua saída ao Atlântico por conta da suposta ameaça de Castela, é sabido que
ambas culturas sempre foram uma única; o amálgama de povos de um tronco comum,
identitários que lutam por uma unidade na diversidade. Após as coroas se unirem
em torno de Felipe II, como uma só nação, a península foi dona do globo
terrestre. O Brasil como entendemos surge à sombra desta união, resultante de
uma cultura transplantada que inventou nações e criou uma nova gente, uma
população de todos os fenótipos, incorporando elementos nativos da América e da
África em uma reedição da cultura hispânica, uma raça cósmica, aliançadas pelos
idiomas de Camões e de Cervantes, compondo o universo ibero-americano que é uma
nova Roma, a latinidade nos trópicos.
Neste
livro, defendo o mundo lusófono, por consequência o Brasil, como sendo parte do
movimento hispanista idealizado pela Geração de 1898, alguns de viés
pessimista, outros nacionalistas exacerbados, porém nos seus particularismos
deixaram etnografias que hoje nos faz repensar o papel da América
Luso-Hispânica do século XXI.
Orelha:
Este
que vos escreve é natural de São Paulo de Piratininga, terra de Anchieta. Filho
de pai espanhol, nascido em Leon, no pueblo Huerga de Frailes, muito próximo à
região da Maragatería (Astorga) – província que já foi palco da Legio VII
Gemina romana e um reino independente, uniu-se com a velha Castilla e tem seu
escudo presente na bandeira da madre pátria – e de mãe caipira, do interior do
estado insurgente que forjou o Brasil e seu território. Da fusão de dois mundos
que se complementam eu vim, e desde pouca idade jamais consegui separar a
cultura hispânica paterna da luso-brasileira materna.
Neste
livro, explico com exemplos históricos e antropológicos o motivo pelo qual
considero a Iberia uma coisa una, por consequência, a América de além mar,
partes da África e as antigas possessões na Ásia, também teriam o mesmo
destino; são crias da velha península que transplantou sua cultura ao redor do
globo – “Não há pedaço de terra no planeta sem uma tumba ibérica” já diz o
ditado.
Faço
um retrato sociológico dos rostos de todas as cores e credos incorporados à latinidade,
que hoje falam as línguas de Camões e Cervantes, produzindo um mundo peculiar
ligado por um cordão umbilical que jamais se rompeu. Em tempos que se falseiam
a História, rejeitando tudo o que lembra a narrativa do “conquistador”, o
decolonialismo pode se contrapor ao imperialismo ianque atual, mas jamais negar
o sangue e a alma das nações que nos forjaram.
Não
trato da Hispânia (como chamavam os romanos) apenas como um local, mas sim uma
unidade de espírito, o norte que agrega o melhor de todas as raças formando um
novo gentílico, cósmico, capaz de contribuir para sociedades que se padronizam,
através de sua cosmovisão herdada de uma gente guerreira, nobre, aristocrática,
não no sentido pejorativo do termo, mas de um povo que ainda tem uma psiquê que
nos remete ao mundo antigo, à capacidade de ser filósofo-artista e soldado,
resistente ao dinamismo da pós-modernidade, mesmo que tal manifestação ocorra
de forma inconsciente. E é justamente esta qualidade de “cavaleiro andante”, de
não se atar às regras e ao trabalho alienante, de ser questionador e eterno
rebelde presente no ibérico que pretendo valorizar neste manifesto.
Divulgação do Livro:
A
Hispanidade para o Mundo Lusófono é uma proposta feita através de uma
argumentação sociológica, antropológica e histórica sobre a grande Ibéria e
seus desafios para o século XXI. Uma federação nos moldes constitucionais que
respeite a autonomia de seus particularismos, seria plenamente possível entre
as duas nações da velha península de além mar para o século XXI, e diria ainda
mais, para a Hispano-américa (incluindo o Brasil) e toda a iberosfera. Não é a
defesa de submissão às antigas metrópoles, mas uma união cultural, com cada
país, seja monárquico ou republicano, exercendo a sua soberania. Remover
fronteiras não significa a dissolução de poderes locais!
Para
tanto, justifico a visão de um universo ibérico não centrado em uma raça em
específico, dado a complexidade de povos que formaram Portugal e Espanha e os
demais que foram incorporados em seus antigos virreinatos (vulgarmente chamados
de colônias). José Vasconselos já falava que o mestiço é uma “raça cósmica”
(leia-se o temo referente à cultura também). Viriato, o expoente herói da
Lusitânia, é herói em Espanha também, pois suas tribos eram do tronco celtibero
que depois da romanização, trouxe a face dos filhos de Netón às legiões que
mais tarde, já cristianizados, visigodos e suevos anexariam com a queda do
império e a ascensão de Alarico. Vale lembrar, que entre os mouros que cruzaram
Gibraltar, depois de uma traição e disputa interna entre os visigodos, vários
povos compunham os exércitos de cimitarras baixo uma elite árabe, porém entre
eles, até eslavos do leste e descendentes dos persas haviam. A Reconquista que
se concluiu em 1492 teve a sua continuação após as descobertas de Colombo e
Vespúcio quando se iniciou o povoamento das Américas pelos ibéricos. Se em 1494
o mundo foi dividido entre esses dois povos irmãos, o cordão umbilical da
Ibéria nunca foi rompido, apesar de disputas inclusive em solo brasileiro entre
bandeirantes e jesuítas, ou os insurgentes que se levantaram contra Felipe II.
Rivalidades à parte, o tipo de colonização português teve características muito
similares ao espanhol, dando uma espécie de unicidade entre os falantes dos
idiomas de Camões e de Cervantes. Nos Lusíadas é mencionado na epopeia de Vasco
da Gama, o navegante, como herói das duas Espanhas! Ambos povos fruto da
fundição de raças que gerou um amálgama inquebrantável, preservando o melhor de
cada etnia, o rosto amorenado do gaúcho, cujas origens maragatas tem
influencias árabes e indígenas, com vestimentas da região da Maragatería, em
León. Também dos mamelucos paulistas no início da Capitania de São Vicente;
bandeirantes como Bartolomeu Bueno da Silva, ou o próprio Anchieta, nascido nas
Ilhas Canárias embora sua origem fosse basca. A antiga Filipéia, capital da
Paraíba antes de se chamar João Pessoa, o nome era homenagem a Felipe II. Como
a noção do V Império do Padre Antonio Vieira também era uma espécie de
Hispanidade, o ideal da Latinidade de uma Nova Roma. A cultura hispânica, e
leia-se, de ambas nações, pois aos romanos a Hispânia era toda a península,
deixou marcas não só no estilo das casas bandeirantes, que se assemelham às de
adobe em Quito e as de Bolívar na Grã-Colômbia, como no nosso palavreado local,
o “Oxente” do baiano, de influência galega, como produziu diversas figuras de
nossa História.
Também
abordo no livro as estruturas que herdamos inclusive da Ibéria medieval em solo
nacional, não apenas explicando a hacienda da hispano-américa, bem como a Casa
Grande e sua união com a senzala, exemplificada por Gilberto Freyre (que é nome
referência ao estudo do hispanismo no Brasil) e as relações de compadrio que se
assemelham ao comitatus dos visigodos. O FOEDERATI, berço da noção de federação
que temos, já era praticado por esse sistema de fidelidade, a FIDES, onde
unidos por um mesmo sangue, senhor e servo se reconheciam como primos ou
parentes, embora houvesse distinção social, e no livro não tenho a intenção de
manter velhas estruturas arcaicas, mas trazer ao estudo uma característica
comunal que forjou uma peculiaridade inclusive ao nosso capitalismo e relações
de Estado, fundindo o público com o privado e pouco afeito à impessoalidade, a
crítica é primordial. Curioso é conseguirmos identificar essa estrutura de
sociedade nos interiores do Brasil antes da urbanização, mesmo entre povos
miscigenados marcados também pelo escravismo, o que nos prova que é possível
dar uma brasilidade e hispanidade ao povo de toda América de línguas latinas, independente
do fenótipo de seus filhos. Darcy Ribeiro já apontava a prática do cunhadismo,
do qual João Ramalho e Caramuru são figuras ícones.
Pensei
que era imprescindível escrever algo sobre o tema, sendo eu um exemplo dessa
integração de nações e continentes irmãos; sou filho de pai espanhol e de mãe
caipira, que metaforizam a união de povos siameses com os rostos opostos, porém
na contemporaneidade, se reconhecem muito mais nas convergências do que nas
ideias que há anos vem tentando separar-nos, importando tudo o que vem de Paris
e Londres. Somos a união da Malinche com Cortez, e um não precisa anular o
outro! O uso da Leyenda Negra por parte dos inimigos de Castela é abordado no
livro também, explico como Guilherme de Orange da Holanda, ainda nas guerras
entre protestantes e católicos durante o reinado de Carlos V, forjou narrativas
contra a Inquisição, depois iriam anexar os relatos particularistas de
Bartolomé de las Casas e dos filhos de Francis Drake, os ingleses, aplaudidos
pela rainha, que martelaram contra a madre pátria por séculos. Tal prática
seria usada depois pelo Big Stick estadunidense visando sua influência sobre o
continente, principalmente depois da derrota da guerra hispano-americana de
Cuba, em 1898.
Trago à discussão
uma outra versão da chegada dos primeiros europeus modernos ao Brasil, em que
Vicente Yáñez Pinzón, irmão de Marin Alonso, que esteve nas caravelas de
Colombo, teria chegado ao Cabo de Santo Agostinho no litoral pernambucano,
antes de Cabral aportar em Porto Seguro (o que não invalida a figura de Cabral
como o precursor do que entendemos de Brasil hoje). O sebastianismo é descrito
também, este tem características peculiares em nosso solo, e tal movimento só
foi possível depois do desaparecimento de Dom Sebastião, tendo como
consequência a União Ibérica (1580-1640). O caso da nossa Amazônia, em que
Francisco de Orellana foi o primeiro a navegar, mas o português Pedro Teixeira
foi o primeiro a fazer o percurso completo. Provando que tal território é
soberano e do Brasil! Bem como as partes que ocupam nossos países vizinhos
também lhes pertencem, e não a nações que visam toma-las de nós. A disputa que
se terminou com o Tratado de Madrid (1750) não se dá mais entre
portugueses-brasileiros e hispânicos irmãos, mas entre interesses de povos do
mundo inteiro que usam ideologicamente antigas feridas entre povos de uma mesma
origem, única e exclusivamente para dividir e assim conquistar.
O
primeiro evento que nos marca como nação, ainda no Brasil colônia, quando
expulsamos o invasor batavo, mostrou um exemplo de brasilidade! Onde mamelucos,
cafusos, brancos, negros, portugueses e hispânicos que aqui viviam, foram
comandados pelo general negro, Henrique Dias, e assim se iniciou a vontade de
um povo diversificado, que anos mais tarde viveria unido baixo uma mesma
bandeira.
Além
do caráter histórico do livro, faço um aparato de observações e algumas
conclusões e propostas para que reinventemos nossa Iberosfera, seja na América,
na Península, em África ou Ásia, e para todo descendente que viva em algum país
não latino também, independente de seu idioma ou aparência, pois sempre irá
pertencer à família da latinidade. Não digo que o socialismo nos moldes
bolivarianos seja a solução, trazer um falso nacionalismo e uma leitura dos
nossos heróis do passado falaciosa só prejudica nossa posição no mundo em nome
de doutrinas execráveis! A liberdade é fundamental, mas em uma época de
múltiplos polos, também precisamos preservar nossas instituições democráticas
sem perdermos nossa característica cultural. O Brasil e nossos países vizinhos
sempre foram vistos como “vira-latas” aos olhos dos preconceituosos, e chegou a
hora de assumirmos para o mundo com orgulho o que nós somos, deixarmos de ser
estrangeiros na nossa própria terra, desterrados na nossa própria pátria. A
hispanidade e junto, a portugalidade, é também a africanidade e o indigenismo,
todos juntos, na construção de um continente unido, que irá contribuir para o
planeta com seus particularismos, sem separatismos, sem anular o todo – a
unidade na diversidade!
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